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A ÚLTIMA ESTRELA

Quarta-feira, 22.03.23

O ÚLTIMO ANJO DE MARIA 1999.jpeg

A ÚLTIMA ESTRELA
*


Um anjo, de negro,

Recolhia do céu

As últimas estrelas da noite

Para que o Sol

Nascesse claro e glorioso
*

 

Uma mulher, de branco,

Recolhia, de uma qualquer janela,

O seu direito de prolongar a noite
*

 

O Anjo olhou a Mulher,

Pequena estrela baça

Teimando em ser estrela

Para além da noite

E se anjos são anjos,

São homens com asas

Sofrendo das mesmas vãs contradições
*

 

O homem com asas

Não fez por maldade,

Fez por tradição:

Não se rouba ao sol

A glória do brilho

Nem se guarda a noite

Por trás da janela,

Que até ente os anjos

Impera o conceito

Do que é preconceito...
*

 

Tocou-lhe ao de leve,

Tão de levezinho

Que mal lhe tocou

E a mulher caiu,

                                                     Caiu, mas subiu

No segundo certo,

                                                       No momento exacto

De alcançar no alto

A Última Estrela.
*

 

Mª João Brito de Sousa

1994
***

À I.C., In Memoriam

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publicado por Maria João Brito de Sousa às 11:27

(RE)NOVOS LUSITANOS

Quarta-feira, 12.10.22

(RE)NOVOS LUSITANOS
*


Tentei erguer um império

Nos abraços de um mortal

E ousei escrever epopeias

Na barra de um avental
*


Assim nasceu um mistério

Ainda por desvendar:

Estando em terra, em cativeiro,

Julgava-me em pleno mar...
*


Então desfraldei as velas

Do meu estranho imaginário

E transformei uma cela

Num galeão de corsário...
*


Hoje heróica lusitana

Dos tempos que vão correndo,

Navego na minha cama

Sobre os sonhos vou tendo!
*

 

Mª João Brito de Sousa

2002
***

In Arquétipos de Uma Mulher Interrompida

Inédito
***

 

rabisco III.jpg

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publicado por Maria João Brito de Sousa às 09:45

LEILÃO

Domingo, 09.10.22

Eu, Hotel dos Templários - 1972.jpg

 


LEILÃO

*

Pus a alma à venda

Por uma noite de sono

Um remendo 

Do tamanho exacto da camada de ozono

E a felicidade 

Do pequeno rebanho 

Que tenho de guardar

*

Ninguém ma quis comprar

E eu

Teimosa

Lancei-a a leilão

Num bairro de sucateiros

Onde alguém ma comprou

Por três dinheiros

*

Tive de a ceder

Que palavra é palavra

E eu sempre fui leal

*

Só não entendo

Por que é que ainda sonho com Morfeu

Tento engendrar o tal remendo astral

E sofro a cada dor de quem de mim nasceu.

*

 

Mª João Brito de Sousa

1991

In Arquétipos de Uma Mulher Interrompida

Inédito

***

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publicado por Maria João Brito de Sousa às 11:19

POEMA DISSILÁBICO

Sexta-feira, 07.10.22

Eu, dois ou três meses (1).jpeg

POEMA DISSILÁBICO
*


Nasceu

Chorou

Sorriu

Cresceu

E viu

Que fora

Mais um

Apenas

Mais um

E tanto

Contudo!
*

Importa

Agora

O sonho

Que traz

Consigo

E tudo

Aquilo

Que dele

Emane
*

Viver

Também

É isto.
*


Mª João Brito de Sousa

06.10.2022 - 13.00h
***

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publicado por Maria João Brito de Sousa às 09:37

VEM!

Sexta-feira, 05.03.21

VEM.jpg

 

VEM!

*

 

Vem,

porque a jangada

em que hoje moro,

é tua

e dentro dela a gente alcança a lua

sempre que a lua vem beijar o mar.

*

Vem,

traz os teus remos,

traz as tuas asas,

vamos encher todas as marés-vazas

da poesia que a gente inventar
*


Vem,

semear espantos,

povoar as águas

até (des)afogar as velhas mágoas

na embriaguez do sonho por sonhar
*


Vem,

que a geometria

deste nosso abraço

vai desabar nos braços do sargaço

no qual, felizes, vamos naufragar...
*

 

 

Maria João Brito de Sousa - 04.03.2021 - 14.50h

 

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publicado por Maria João Brito de Sousa às 08:45

ALÍNEA M

Segunda-feira, 05.10.20

al´nea M.jpg

Alínea M

*


Confusa,

julgo ter acordado

ao lado de uma Natália

ainda  incompletamente diluída

no esquecimento de um qualquer sonho

que me não recordo de ter sonhado

*

Só essa estranha sensação,

mais do que memória

mas ainda distante do palpável

teima em reocupar um lugar

num tempo e num espaço

a que há muito deixou de pertencer.

*


Agora debruço-me da janela,

creio ver decompor-se o mito de Medeia

na terra adubada da floreira do vizinho

e não, não posso jurar que esteja acordada,

Tudo se me enevoa diante dos olhos.
*

 

Piso finalmente o chão

e ergo-me do sonho

depois de despidas as ilusões.

*

Nenhum ouro,

nem sombra de alquimia;

Medo não nasceria dessa matinal estranheza.
*

 


Maria João Brito de Sousa - Outubro, 2020

 

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publicado por Maria João Brito de Sousa às 12:02

TEMPO

Terça-feira, 15.01.19

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TEMPO

*

Tu dizes Eu

como quem bebe um copo de astros

e teces os corpos

nas arestas das horas

com

o pasmo e a leveza

das mãos que não tens

*

Tu dizes Vida

como se ela estivesse ainda por nascer

não páras de moldá-la

e

de cobri-la

dos indispensáveis acessórios

das teias e fungos e limos e dourados bolores

*

Tu passas

como se de todo não passasses

porque

 não tens memória

que,

a essa,

somos nós

nós

bichos e sombras e plantas

e

serenas pedras de todos as escarpas

que ta vamos tecendo

para que

nela

te possamos (re)conhecer

*



Maria João Brito de Sousa – 15.01.2019 – 12.43h

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publicado por Maria João Brito de Sousa às 12:36

EU DIGO, TU DIZES, ELE DIZ...

Terça-feira, 30.10.18

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EU DIGO, TU DIZES, ELE DIZ...

*



Diz um senhor dos jornais

(aos ais...)

que alguns intelectuais

nunca serviram pra mais

por não serem marginais.

*



Diz um senhor das revistas

(sem pistas...)

que os desgraçados artistas

foram sempre uns arrivistas

quase todos elitistas.

*



Digo eu

que sou poeta

que o senhor só diz é treta...

Forreta!

*



Maria João Brito de Sousa – 30.10.2018- 21.30h





 

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publicado por Maria João Brito de Sousa às 23:20

SEM MEIAS-TINTAS

Domingo, 20.05.18

 

Eram simpáticos

medianamente simpáticos

nos seus cumprimentos

e nos seus sorrisos

mais ou menos artificiais

mais ou menos impostos

mais ou menos convenientes

 

Ele

a partir desse dia

aborrecera

flores, lacinhos, veludos e doirados…

aborrecera os meio-doces

rebuçados de hortelã-pimenta

as meias-criações

as meias-paixões

as meias-convicções

e

todas as meias-tintas

que perturbassem

o canto genuíno do melro

o uivo do lobo absoluto

o rosnido do lince interior

 

Sequóias!

Ainda se lhe dessem sequóias

de raiz presa à terra

como as vozes dos deuses menores…

 

Ainda se lhe dessem

esses arranha-céus de fibra e floema

que aspiram aos longes dos astros

mais ou menos longínquos 

e lhe renovassem a promessa

de ascender com eles…

 

Mas tudo o que se lhe cumpria

eram aqueles meios sorrisos

aqueles rictos e rituais

mais ou menos postiços

que afirmavam

agradar ao Deus sem tamanho

a quem atribuíam

todas

todas as autoridades

 excepto a de aborrecer

as meias-genuinidades.

*

Maria João Brito de Sousa – 07.04.2010 – 19.00h

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publicado por Maria João Brito de Sousa às 18:17

CADA POEMA

Sábado, 19.05.18

2016-04-08-parto-da-viola-bom-m-nage-1916 _ Amadeo

CADA POEMA

Cada poema
Tem asas de papel nascendo incertas
Como velas rumando à descoberta
Da Ilha de S. Nunca da partida

*

Quando ressurge
Muito embora vencido é temerário
Como a luta tenaz de cada operário
Que aspira à igualdade prometida

*

Onde um termina
Começa um outro verso inevitável
Cada um deles gerando um infindável
Rosário de memórias de uma vida

*

Cada poema
Tem alma de mulher, corpo de chama
De onde irrompe uma voz que então proclama
O culminar da luz na pele rendida

*

Cada poema
É raiva, urgência, amor,
Silêncio, grito e voz da mesma dor
Numa explosão domada ou incontida

*

Cada poema
É mais do que uma inércia ou um transporte,
É eixo, é a matriz deste suporte
Das minhas transgressões de fera ferida

*

Cada poema
Tem sempre a dimensão de um corpo estranho,
Imensurável, pois não tem tamanho,
Porta-voz de uma força indesmentida

*

Quando ressurge
Muito embora vencido é temerário
Como a luta tenaz de cada operário
Que aspira à igualdade prometida

*

Onde um termina
Começa um novo verso inevitável,
Cada um deles gerando um infindável
Rosário de memórias de uma vida.

*

 

 



Maria João Brito de Sousa – 16.09.2010 – 14.38h

 

 Parto da Viola, Amadeo de Souza-Cardoso

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publicado por Maria João Brito de Sousa às 20:00








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