QUE PENA! - Um poema anti-poético e egoísta, para quando fizer falta rosnar
QUE PENA!
*
Que pena!
Tenho tanta pena de ter pena
dos olhos de luar que não tiveste,
da refeição frugal que não fizemos
no tal dia em que nos não encontrámos
*
Dessas mãos de sal que te não vi,
sublimando a saudade em gestação,
subiria – talvez…- o aceno prometido
ou nem sequer esboçado,
à força de tardio
*
Nos teus lábios que nunca experimentei
- porque não eram lábios
os riscos trémulos e desbotados
que jamais desenhámos
sobre a suspeição do beijo…-
um sorriso clonado
de todos os esgares que lhe foram anteriores
*
Que pena das horas que não passámos juntos
nessas manhãs,
essas
que nos encerram
na urgência banal e rotineira
- tão desmesuradamente banal e rotineira! -
do desejo insuspeito
que adivinho
no refrão de cada cantilena
e das tardes,
- quem sabe? -
atarefadas, urbanas, burguesas,
passeando entre o plano do fogão de quatro bicos
e a perpendicular do mar
- desse mar que só pode ser olhado por um de cada vez -
aborrecendo o momento seguinte,
barulhentas, conflituosas e – porque não? -
tão exactamente iguais às tardes que são as dos outros
*
Mas pena,
pena a sério,
pena crua e inenarrável,
daquela que magoa,
rasga por dentro e deixa cicatriz,
Pena teria eu tido de não ter podido ser quem sou!
*
Maria João Brito de Sousa – 28.05.2011 -14.47h