BRADO
Cresce puríssimo,
forte, ininterrupto,
claríssimo nas mãos imaculadas pelo uso
(porque apenas o uso lhes confere
a transparência das grandes, invencíveis compulsões)
*
Sábio, porque justo,
floresce, rompendo o húmus das palavras
ao dar-lhes o sentido de todos os sentidos
na lucidez dos que vivem paixões indomáveis
*
De todos nós,
porque se sobrepõe a cada uma das nossas vontades,
se multiplica nas veias da terra
e se mistura à lava dos vulcões que vamos sendo,
não será detido
nos becos do receio,
nem ave nenhuma voará mais alto
do que esse eco
que
o vento,
zunindo,
transporta consigo
desde o mais profundo da nossa justíssima revolta
*
Límpidas, crescem as sílabas
que se desnudarão na invencibilidade do nosso brado!
*
Maria João Brito de Sousa - 27.09.2012 - 01.53
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NASCE, POESIA!
NASCE, POESIA!
*
Porque o que és
me não cabe nas mãos fechadas,
escorrem-me,
por entre os dedos,
estas sobras
do que recuso transformar
em gesto de troca,
artigo de compra e venda,
vaidade, embriaguez, culto ou ritual
e que és tu,
Poesia.
*
Divinizam-te
alguns
o corpo que não tens
no altar que insistes em não ser
mas eu sei-te no cerne de todas as coisas
escorrendo inevitavelmente
de todos os poros, por todas as frestas,
limpa, lúcida, viva, (in)explicada…
*
Cantas
ainda
onde a esperança desistiu de viver
ressoas no vácuo, apesar de inaudível,
desdobras-te
em invisibilidades e vislumbres
e
acendes-te, sublime,
no arrepio de cada escuridão
*
Inútil
ou não
Nasce, Poesia!
*
Maria João Brito de Sousa – 11.09.2012 -01.53h
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METÁFORA - O Manifesto
METÁFORA
(Manifesto)
*
Eu digo-te
que o sol floresce limpo
sobre o estrume das aparências
e que as palavras são casas nas cidades da voz
*
Digo-te
que as ruas são mãos a (re)pousar,
que as estátuas de pedra são canções
e que as canções são luas, de tão brancas…
*
Dir-te-ei,
vez por outra,
que as plantas são mulheres e homens
cansados da colheita improvável,
que os dias – todos eles –
são movimento,
que as noites são o esconderijo
dos sonhos à espera de acordar
e que os muros são pontes entre agora e depois
*
Falar-te-ei de passos sem distância,
de espaços sem medida,
de memórias sem tempo
e de gente sem medo de morrer,
mas jamais me ouvirás falar de renúncia
enquanto o murmúrio me for permitido
na cidade da voz libertada
*
Também a metáfora se come, se bebe
e não sabe render-se enquanto viva
*
Maria João Brito de Sousa – 03.09.2012 – 18.12h
Imagem retirada do jornal "Avante!" - Guernica, Pablo Picasso