FIGURA DE PROA (poema descritivo de um sonho real)
FIGURINHA DE PROA
Pinta-se o céu de negras aguarelas
Rasgam-no
De alto a baixo
Centelhas amarelas
E grita irada
A voz de algum trovão
Na praia choram
As mulheres dos pescadores
E
Sou
No sonho
A figura de proa
Da barca de insuspeitos pecadores
Eu
Que tenho medo
Dos líquidos abismos
E da dureza impenetrável dos rochedos
A condenar-me a morrer de mil medos
Num negro mar que me desconhecia
E
Do fundo do mar
Um deus rugia:
- Por mim não passarás impunemente!
Ergo a voz
Numa voz que lhe pedia:
- Salve-se, ao menos, a tripulação!
Reboa a gargalhada em que o deus respondia:
- Quem és insignificante criatura
Que pedes por vidas que não são a tua?
- Sou quem da barca se fez capitão,
E por amor de quem nela labuta
Tomo-lhe o leme nesta minha mão!
Neptuno troça
Mas abranda a fúria
Vulcano cala as vozes do trovão
E a Barca balança docemente
Como se o universo inteiro
De repente,
Se comovesse com tal devoção
Maria João Brito de Sousa - 1993 (?)
*
Nota - Poema reformulado a 21.12.2015
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EXECUÇÃO
EXECUÇÃO
*
Naquele instante
As rosas multiplicaram-se
Em negros abraços
E os trinta e três
Melros-azuis
Que moravam
No jardim da guerra pontual
Desdobraram-se em trinados
Que soavam,
Ao longe,
Como o assobio
Das balas perdidas no muro
A que ela,
De olhos (des)vendados,
Apoiara o corpo (ainda) vertical.
*
Maria João Brito de Sousa - 2008